A Câmara Municipal de Nova Lima realizou, na noite dessa segunda-feira (15), uma Audiência Pública para debater o Projeto de Lei nº 2.640/2025, de autoria do Poder Executivo, que estabelece diretrizes, define o plano e aprova a Operação Urbana Consorciada Nova Vila (OUCNV). O projeto prevê a transformação da antiga área industrial da AngloGold Ashanti, localizada na região da Praça do Mineiro, em um novo bairro planejado, reunindo moradia, comércio, cultura, lazer, áreas verdes e infraestrutura viária.

Com 4 horas e 23 minutos de duração, a audiência entrou para a história do Legislativo nova-limense como uma das mais longas já realizadas, refletindo a complexidade do projeto e o alto nível de interesse e mobilização da população.

A audiência foi presidida pelo Presidente da Casa, vereador Thiago Almeida, com vice-presidência do vereador Zelino. Estiveram presentes, também, Fernando Antônio Cláudio, Diretor de Comunicação, Comunidades e Relações Governamentais da AngloGold Ashanti; Fernanda Martins Guabiroba, Superintendente de Fechamento de Mina e Minas Paralisadas da AngloGold Ashanti; David Gurgel, Presidente da Associação Comercial e Empresarial de Nova Lima (ACE Nova Lima); Gustavo Gomes Peixoto, Secretário Municipal de Política Urbana; Glauco Santiago, da Construtora Concreto, e demais autoridades. O prefeito João Marcelo Dieguez Pereira foi representado pelo Procurador-Geral do Município, Arthur de Araújo Souza e Soares.

O plenário da Câmara ficou completamente lotado durante toda a audiência. Muitos moradores de Nova Lima não conseguiram entrar para acompanhar os debates e assistiram do lado de fora, por meio de um telão no hall do prédio. O vereador Wesley de Jesus chamou a atenção para a chegada de um ônibus com cerca de 50 funcionários da Federação das Indústrias de Minas Gerais (FIEMG), o que contribuiu para a lotação do espaço e gerou questionamentos por parte de moradores locais, que são os verdadeiros interessados em debater o projeto. “Quero primeiramente registrar aqui e deixar claro que não é nada pessoal contra as pessoas que estão aqui. O ato da Fiemg parar um ônibus na porta dessa Câmara e trazer funcionários que nem moram aqui é um ato desrespeitoso. Isso não deveria ter acontecido. Esse assunto é um assunto importante e lá fora têm dezenas de nova-limenses querendo ouvir, querendo participar. É uma vergonha para a AngloGold. Eu quero deixar isso registrado aqui”. A FIEMG, por meio de suas unidades do SENAI, é parceira da AngloGold Ashanti, da construtora Concreto e da Prefeitura de Nova Lima no projeto.

Durante todo o debate, moradores, representantes da sociedade civil, entidades de classe e lideranças comunitárias puderam se manifestar livremente, tanto os favoráveis quanto os contrários ao projeto. O Presidente da Casa garantiu o direito de fala a todos os inscritos, conforme as normas que regem uma audiência pública.

A sociedade se mostrou claramente dividida, apresentando críticas e preocupações. Entre os principais pontos levantados pelos moradores e entidades contrárias estiveram o risco ambiental, especialmente em relação ao possível entulho de obras com presença de arsênio, devido ao histórico minerário do terreno; a ausência de estudos aprofundados sobre impacto no trânsito; e a crítica ao pedido de tramitação em regime de urgência, considerado inadequado diante da complexidade e dos impactos do projeto. Comerciantes locais também afirmaram que não foram consultados durante a elaboração da proposta.

O vereador Taioba se manifestou: “não estamos aqui para impedir o progresso, mas para aperfeiçoar sobre as responsabilidades assumidas pelo município”. Os demais membros da Casa Legislativa também. “É preciso que a gente aperfeiçoe o modelo do Projeto de Lei”, disse Pedro Dornas. A vereadora Viviane Matos defendeu que outras regiões integrem o projeto: onde está a conexão Boa Vista, Mingu e Mina D´água?”.

“Tendo ouvido a população, a gente vai ter condição e oportunidade de evoluir e de conseguir, no tempo determinado, deliberar sobre esse projeto”, falou Álvaro. “Queria pedir a possibilidade da Comissão de Meio Ambiente estudar sobre a necessidade que nós teremos espaço voltado para a educação. Se isso pode ser objeto de emenda do Projeto de Lei”, solicitou Wesley de Jesus.  “Talvez seja melhor esse projeto ficar mais tempo aqui nesta Casa para poder discutir”, pontuou o vereador Danúbio. Gliverson Marques defendeu o debate: “eu tô aqui com total compromisso de entender e enxergar qualquer alteração do projeto”.

Mael Soares destacou o déficit habitacional no município: “na parte de arquitetura, eu acho que o projeto ficou muito bonito, mas eu sempre percebi que a questão habitacional é o maior gargalo da aprovação desse Projeto”. Nilton criticou a desigualdade social: “o restante da terra ociosa que sobra em Nova Lima é feito condomínios, onde o trabalhador não tem a mínima possibilidade de entrar para morar. A não ser para fazer faxina ou fazer jardim”. “Aquela região precisa ser viva, precisa trazer uma outra realidade para o município”, disse Silvânio. O vereador Abner Henrique participou de maneira remota.

O Procurador-Geral do Município, Arthur de Araújo Souza e Soares, enfatizou ações para equilibrar impactos negativos: “é justamente exigido do setor produtivo da nossa cidade medidas de compensação pra atenuar a mobilidade urbana”.

Segundo o arquiteto Glauco Marques, responsável técnico pelo projeto e morador de Nova Lima, o encontro foi positivo: “a gente ouviu a comunidade, entendeu as necessidades e sai com a certeza de que temos uma oportunidade real de revitalizar o centro da cidade”.

O que é uma Operação Urbana Consorciada

A Operação Urbana Consorciada (OUC) é um instrumento legal de planejamento urbano previsto no Estatuto da Cidade. Ela possibilita a ação conjunta entre o poder público e a iniciativa privada para promover transformações estruturais em áreas específicas do município, buscando o desenvolvimento urbano de forma equilibrada, sustentável e planejada. Nesse contexto, o debate público se torna uma etapa fundamental para que a comunidade compreenda a dimensão das intervenções propostas, bem como seus impactos ambientais, sociais, econômicos e estruturais.

De acordo com a Prefeitura de Nova Lima, o Projeto Nova Vila prevê a criação de um novo núcleo urbano com 480 unidades habitacionais verticais e 62 unidades horizontais, totalizando uma estimativa de 2.168 habitantes. O plano contempla ainda uma área única de lazer, pensada para promover integração entre os condomínios, além de espaços culturais e comerciais. A OUC Nova Vila abrangerá as áreas das antigas Mina Velha e Mina Grande, locais profundamente marcados pela memória mineradora do município.

Segundo informações apresentadas pela AngloGold Ashanti, o projeto inclui a implantação de um museu, um núcleo esportivo, um centro comercial e um shopping do povo, com foco na valorização da identidade local e no estímulo à economia. Um dos principais eixos estruturantes do projeto é a implantação de uma nova avenida, com cerca de 2 km de extensão, equipada com ciclovia e calçadas para reordenar o sistema viário, reduzir gargalos no trânsito e criar uma nova ligação entre o Centro e os bairros da parte baixa da cidade. O plano urbanístico também prevê a criação de um parque linear, além da destinação de parte da área total à preservação ambiental, com corredores ecológicos de Mata Atlântica.

Próximos passos

A Audiência Pública deixou claro que o Projeto Nova Vila desperta expectativas, mas também preocupações legítimas da população. A forte participação popular reforçou a necessidade de amplo diálogo, aprofundamento dos estudos técnicos e transparência antes do avanço da tramitação legislativa.

O debate segue agora no âmbito da Câmara Municipal, com o desafio de conciliar desenvolvimento urbano, preservação ambiental, memória histórica e qualidade de vida para os moradores de Nova Lima.

“Aprendi, ao longo da vida pública, que democracia não se sustenta no silêncio nem na facilidade. Ela se constrói no respeito, nas regras e na capacidade de conduzir o diálogo mesmo quando o cenário é desafiador. Conduzi uma audiência pública longa e complexa. Foram 4 horas e 23 minutos de debates, com o direito de fala garantido a todos os inscritos. A Câmara é um espaço público, aberto, plural. E o meu papel como Presidente é assegurar que esse espaço funcione com respeito, organização e diálogo. A população de Nova Lima esteve presente, se manifestou e tudo o que foi dito será considerado, porque decisões que impactam a cidade precisam respeitar sua história, seu povo e o futuro que queremos construir juntos”, finalizou o Presidente, vereador Thiago Almeida.